Caso Odebrecht: Caíram Presidentes na América Latina, mas há "silêncio" em Angola
Os negócios da Odebrecht em Angola voltam a ser alvo
de questionamento, pouco depois de um antigo ministro ser detido em Moçambique
por alegado envolvimento num esquema de corrupção relacionado com a construtora
brasileira. Ativistas e políticos da oposição angolana questionam: se o
Ministério Público moçambicano investigou as denúncias de corrupção em que a
construtora brasileira estará envolvida, porque que é que a Procuradoria
angolana não faz o mesmo? Mas o "silêncio" permanece e as críticas
aos órgãos do país continuam. Entretanto, passam mais de dois anos desde que a
Odebrecht admitiu ter pago subornos.
De acordo com o Departamento de Justiça dos EUA, a
empresa gastou cerca de 788 milhões de dólares em "luvas" para
funcionários de Governos de 12 países. Em Angola, a Odebrecht terá
desembolsado, entre 2006 e 2013, mais de 50 milhões de dólares para subornar
oficiais do Governo e conseguir contratos públicos, segundo as autoridades
norte-americanas.
De
lá para cá, vários ativistas têm pedido à Justiça angolana para dar seguimento
ao caso no país. Mas o "silêncio" é cada vez mais ensurdecedor,
comenta o jurista e deputado independente da Convergência Ampla de Salvação de
Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), Lindo Bernardo Tito.
"Seria
interessante que a própria Procuradoria-Geral da República (PGR) pudesse abrir
um inquérito judicial para ver qual foi a relação entre a Odebrecht Angola e o
Executivo do Presidente José Eduardo dos Santos", disse o parlamentar da
terceira força política em Angola. A gigante brasileira foi a responsável por
grandes empreendimentos em Angola. Construiu as estradas nas províncias de
Malanje, a norte, e no Huambo, a sul do país, em 2012. Edificou ainda o sistema
de transporte associado ao Aproveitamento Hidroelétrico de Laúca.
Mas para o deputado Lindo Bernardo Tito, a relação entre a antiga governação de José Eduardo dos Santos e a construtora brasileira Odebrechet é "suscetível de muitos questionamentos".
"Deixou muitas zonas cinzentas questionáveis, obviamente. Porquanto é visível que, em várias obras que essa empresa assumiu, algumas não terminaram, e as que terminaram, terminaram com muito defeito. Aliás, a própria aproximação entre o presidente da Odebrecht e do ex-Presidente José Eduardo dos Santos é suscetível de algum questionamento".
Por seu turno, o ativista cívico angolano Nelson Euclides, que se junta ao coro de vozes que criticam o silêncio da justiça, pede uma investigação aos contratos da construtora Odebrecht em Angola. "É do conhecimento de todos que esta empresa tem sido alvo de polémica a nível internacional, tudo porque há indícios de que em todos os países em que a empresa prestou serviço houve supostamente envolvimento de corrupção".
No Brasil, a Odebrecht está envolvida no maior escândalo de corrupção do país, descoberto no âmbito da "Operação Lava Jato", e vários políticos, incluindo o ex-Presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, foram condenados à prisão. O escândalo resvalou para o Peru, onde quatro ex-Presidentes também foram investigados. Um deles, Alan García, que se suicidou pouco antes de ser detido por alegado envolvimento no caso daquela empresa.
Este mês, em Moçambique, o antigo ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula, foi detido preventivamente. É suspeito de ter recebido dezenas de milhares de dólares para facilitar a adjudicação de obras do Aeroporto de Nacala à Odebrecht. O ex-ministro das Finanças moçambicano Manuel Chang também é arguido no caso.
A
Odebrecht não está apenas associada a esquemas de corrupção. Em 2017, a construtora
assinou um acordo de 10 milhões de dólares com a Justiça brasileira por manter
mais de 400 trabalhadores em condições semelhantes à escravidão durante a
construção da Biocom, uma fábrica de açúcar e etanol em Angola. Antes, em 2016,
o jornalista e ativista angolano Rafael Marques também já havia denunciado
casos de morte e tortura de camponeses em áreas onde a construtora brasileira
operava.
Mas,
vários anos depois, ainda não há nenhum processo judicial em curso movido pela
Procuradoria-Geral angolana. E o ativista angolano Nelson Euclides questiona:
Por que continua a Justiça em silêncio?
"Questiona-se o facto de a nossa PGR não se pronunciar sobre essa empresa uma vez que a mesma prestou muito serviço no nosso país, mas notamos que há um silêncio por parte da PGR e procuramos saber porquê, se noutros países em que a empresa prestou o serviço está a ser julgada, porque no nosso país não se diz nada? Isso é preocupante enquanto cidadão e enquanto país."
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